quinta-feira, 14 de junho de 2007

Barba Azul

Há qualquer coisa com as portas fechadas, bem sabemos, que nos suscita a curiosidade e nos remete invariavelmente para a inferência. Podemos imaginar, com base nos passos em surdina, a compasso cansado, tipo batimento cardíaco, que se trata de um velho coxo. Ao final de alguns minutos essa leve impressão transforma-se numa convicção e quase podemos ver o tal velho dar voltas à sala. Ora, para que uma asserção seja válida, em princípio, devemos poder verificá-la de forma não inferencial. Ou seja, abrir a portar e confirmar que de facto o velho coxo coxeia (ou não). É no instante imediateamente antes que se nos coloca o dilema da mulher do barba azul: abrir ou não abrir a porta – por exemplo, formulando a pertgunta “será que a minha curiosidade legitima o acesso a esse espaco privado?”. O conto de Perrault, nesse aspecto, é extremamente claro; tenta convencer-nos que a curiosidade tem quase sempre consequências negativas, que o acesso é reservado a alguns e que a transgressão é punida. Mas a moral de Perrault não é a mesma da do ciberespaco. E na verdade, todos sabemos que a mulher do Barba Azul “fez bem” em abrir a porta (por diferentes razões que não vale a pena esclarecer). Outra questão idiota, que vale a pena colocar, é: por que raio é que o Barba Azul deu a chave à mulher se não queria que ela entrasse no quarto fechado? Claro a outra pergunta idiota que podemos fazer é: por que raio é que eu estou a falar do Barba Azul, e da chave e do acesso... Nao tenho nada contra os sites, blogs, etc privados, pagos, e tudo mais, mas não percebo, vão-me desculpar, qual é o interesse de ter links num blog aos quais o acesso é negado? Talvez pelo prazer da inferência, que eu pessoalmente considero uma actividade estimulante. Na verdade, teria sido mais facil dizer: olha lá, posso dar uma vista de olhos no teu blog? Mas, para além de ser uma questão de princípio, arriscamo-nos sempre a ouvir a resposta que o barba azul teria dado à mulher se esta lhe tivesse dito: olha lá, deixa-me ir dar uma vista de olhos aquele quarto fechado... Fica a provocação.

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